Política de Cookies

Este site utiliza Cookies. Ao navegar, está a consentir o seu uso.

Saiba mais
Compreendi

História evolutiva e conservação de espécies icónicas

Filogeografia, genética populacional e conservação da palanca-negra-gigante 

A palanca-negra-gigante (Hippotragus niger variani) é um dos antílopes mais espetaculares e dos últimos grandes mamíferos descritos em África. Esta subespécie, considerada o símbolo nacional de Angola, encontra‑se limitada à bacia do Alto Kuanza, no Centro de Angola. Apesar de manter um elevado valor cultural e simbólico, é um dos mamíferos mais ameaçados de extinção no mundo.

Em consequência da intensa perseguição por caçadores durante a primeira metade do século XX, as primeiras tentativas de conservação da palanca‑negra‑gigante foram realizadas através da criação de duas áreas de conservação e o estabelecimento de uma regulamentação rígida durante a década de 1960. No entanto, estas áreas de conservação foram abandonadas pouco depois da independência do país em 1975. Durante muito tempo, temeu-se que a espécie tivesse sido extinta devido à guerra civil, mas no início de 2005, foi possível provar a sobrevivência da espécie, primeiro a partir de análises genéticas de fezes, e depois com a confirmação por armadilhas fotográficas. Atualmente, a palanca‑negra‑gigante é o ponto principal de um programa de conservação que está a promover com sucesso a sua recuperação. 

O projeto sobre a filogeografia, genética populacional e conservação da palanca-negra-gigante, iniciado há já vários anos, tem vindo a contribuir de um modo decisivo para o desenho e implementação de programas de conservação desta espécie. A utilização de dados genéticos, para além do esclarecimento da componente filogeográfica e taxonómica, tem fornecido valiosas informações relativamente ao nível da diversidade genética das diferentes populações de palanca-negra-gigante e, ainda, esclarecer a ocorrência de hibridação desta espécie com outra palanca – a palanca-ruana. Por exemplo, o uso de ferramentas moleculares na análise de um conjunto de dados muito extenso que incluiu amostras contemporâneas e amostras pré guerra obtidas em coleções de história natural de museus de todo o mundo, permitiu verificar que as populações de palanca-negra-gigante sofreram nas últimas décadas reduções drásticas dos seus efetivos populacionais, o que aliado a hibridação com a outra subespécie, constituem um forte motivo de preocupação.   

Neste sentido, o projeto de conservação da palanca negra gigante tem vindo a por em prática um plano de que incluiu: i) reforço da monitorização das populações da espécie através de uma rede de câmaras de captura fotográfica; ii) seguimento de indivíduos equipados com coleiras de rastreamento, o que permite uma vigilância muito acrescida e a recolha de informação sobre a biologia da espécie; iii) translocações, esterilização de híbridos e a construção de recintos para reprodução da palanca-negra-gigante para enfrentar a crise de hibridação com a palanca-ruana.

Não obstante o enorme esforço dedicado nas últimas décadas à conservação deste icónico antílope, a prossecução dos trabalhos de monitorização e de investigação nas áreas da biologia reprodutiva, ecologia e história evolutiva são fundamentais para a aplicação de estratégias de conservação que assegurem a sobrevivência desta espécie.
Conservação dos cães selvagens de Angola

Os cães selvagens africanos (Lycaon pictus), amplamente distribuídos por toda a África Subsariana no passado, a sua distribuição geográfica atual encontra-se bastante fragmentada e restrita a regiões do sul de África. Esta espécie está ameaçada de extinção, apresentando uma forte tendência para o declínio das suas populações devido à fragmentação contínua do seu habitat, que, em consequência, origina conflito com os humanos, sendo vítimas de perseguição por criadores de gado, acidentes em estradas, doenças de animais domésticos. Em Angola, há relatos históricos de ocorrência de cães selvagens em vastas áreas do país. No entanto, décadas de agitação política não permitiram a colheita de dados detalhados e atualizados sobre a distribuição e estado de conservação das suas populações. Assim, nos últimos anos, equipas do TwinLab CIBIO-Angola tem vindo a desenvolver esforços para determinar a distribuição atual destes cães selvagens e aprofundar os conhecimentos sobre a estrutura genética, ecologia e dinâmica populacional, utilizando métodos de campo para levantamento de populações de baixa densidade, tais como genética não invasiva, armadilha fotográfica, estimulação acústica e telemetria. Tendo em conta o elevado nível de fragmentação do habitat e o número relativamente reduzido de indivíduos por população, a utilização de dados moleculares reveste-se da maior importância para determinar níveis de diversidade genética e fluxo génico.

Os resultados desta investigação têm mostrado que os cães selvagens ainda estão presentes em Angola em números razoáveis, ocorrendo em grande parte da sua distribuição histórica conhecida, mas em populações bastante fragmentadas. Algumas populações presentes em áreas protegidas, como as do Parque Nacional Bicuar, no sudoeste de Angola, e do Parque Nacional Mavinga-Luiana, que representa o segmento angolano da Área de Conservação Transfronteiriça do Kavango Zambeze (a maior área protegida do mundo, englobando cinco países) possuem aparentemente densidades saudáveis, mesmo em áreas de baixa densidade de grandes ungulados e proximidade com humanos. Estas descobertas destacam a importância de Angola para a conservação de um dos grandes carnívoros mais ameaçados de África e fornecem informações básicas para implementar programas de monitorização de longo prazo e ações de conservação desta espécie na África Austral.